Caixa de texto:

 

 

 


Estado do Mundo 2001

 

Relatório Anual do Worldwatch Institute

em Direção a uma Sociedade Sustentável

 

 

Capítulo 1

_______________________

 

PLANETA RICO, PLANETA POBRE

 

Christopher Flavin

Presidente do Worlwatch Institute

 

Uma visita ao Estado da Bahia, Brasil, proporciona visões contrastantes do estado do mundo na aurora do novo milênio. Situada 13 graus ao sul do Equador, Salvador, sua capital, tem uma população de mais de 3 milhões de habitantes e uma aparência totalmente moderna. O centro ostenta grandes prédios comerciais e muitas construções em andamento e suas rodovias repletas de veículos utilitários esportivos. O estado também é rico em recursos naturais: a riqueza proporcionada pelo ouro e cana-de-açúcar fizeram de Salvador o local óbvio para ser o principal porto e capital do Brasil colônia durante dois séculos.[i]

 

Durante um período estagnada – a escravidão só foi abolida no final do século XIX, uma das últimas regiões a acabar com esta prática – a economia da Bahia, hoje, está em rápida expansão. O estado possui um próspero setor industrial e se tornou atraente para muitas das principais multinacionais, inclusive montadoras que lá implantaram algumas das suas unidades mais avançadas. A informática está num frenesi particularmente competitivo. Os provedores da Internet no Brasil estão conectando consumidores de graça, e telefones celulares são quase tão comuns como em muitas cidades européias.

 

Entretanto, se nos detivermos um pouco mais, veremos que outra Bahia ainda está presente. As grandes favelas que cercam a periferia de Salvador estão abarrotadas de milhares de pessoas pobres, carentes de muito mais que celulares e computadores: sanitários, água corrente e livros escolares estão entre os serviços básicos e produtos indisponíveis a muitos dos pobres da Bahia. Carências semelhantes podem ser notadas ao sul de Salvador, ao longo do litoral agreste da Bahia: o colapso de muitas das ricas fazendas de cacau causado por uma praga devastadora, a “vassoura de bruxa”, juntamente com um declínio agudo nos preços mundiais de cacau, deixaram milhares de trabalhadores agrícolas sem emprego nem condições de sustentar suas famílias.

 

A situação ambiental da Bahia está igualmente desequilibrada. Considerada por ecólogos como um dos “ hot-spots”(áreas críticas, com maior densidade de vida do mundo), a Mata Atlântica cobre mais de 2.000 quilômetros do litoral subtropical do Brasil. Em 1993, biólogos, trabalhando numa área ao sul de Salvador, identificaram um número recorde mundial de 450 espécies de árvores em um único hectare.  (Um hectare de floresta no nordeste dos Estados Unidos contém caracteristicamente 10 espécies.) Na última década, os líderes políticos e empresariais da Bahia reconheceram a riqueza extraordinária de seu patrimônio biológico – áreas silvestres estão sendo protegidas, instalações de pesquisa ecológica estão sendo implantadas e resorts ecoturísticos surgem por todos os lados. Um aviso no aeroporto chega até a alertar os viajantes que a remoção de espécies endêmicas é um crime.[ii]

 

Todavia, sinais de destruição abundam: a pecuária se espalha onde outrora vicejavam as florestas mais ricas do mundo; 93 porcento da Mata Atlântica já se foi, e o que resta está fragmentada em pequenos lotes. A pressão nestes últimos pedaços de floresta é gigantesca – tanto de corporações e latifundiários poderosos, ávidos para vender produtos florestais e agrícolas nos mercados mundiais, quanto de famílias pobres, desesperadas em busca de sustento.[iii]

 

Este quadro da Bahia no ano 2000 é replicado em dezenas de locais em todo o mundo. É o quadro de um mundo que passa por mudanças extraordinariamente rápidas, entre disparidades imensas e cada vez maiores. A prosperidade econômica sem precedentes, o surgimento de instituições democráticas em muitos países e o fluxo quase instantâneo de informações e idéias através de um mundo recém-interligado, nos permitem enfrentar desafios negligenciados durante décadas: atender às necessidades materiais de todos os 6 bilhões de membros da raça humana e restaurar um equilíbrio sustentável entre a humanidade e os sistemas ecológicos da Terra.

 

Este é um momento histórico, talvez até mesmo evolucionário. Tragicamente, não está sendo aproveitado.  Apesar do incremento no crescimento econômico nos últimos anos e de ganhos significativos nos níveis de saúde e educação em muitos países em desenvolvimento, o número de pessoas sobrevivendo com menos de US$ 1 por dia – o limiar da pobreza utilizado pelo Banco Mundial – foi de 1,2 bilhão em 1998, quase inalterado desde 1990. Em algumas partes do mundo, incluindo a África subsaariana, sul da Ásia e a antiga União Soviética, o número dos que vivem na pobreza é substancialmente maior do que as cifras registradas há uma década. [iv]

 

A luta para recuperar a saúde ecológica do planeta revela um quadro semelhante: algumas poucas batalhas foram ganhas, mas ainda estamos perdendo a guerra propriamente dita. Taxas de crescimento de dois dígitos nos mercados de energia renovável, mais o segundo ano de declínio em emissões globais de carbono, por exemplo, foram insuficientes para reduzir o ritmo da mudança climática mundial. Na realidade, evidências recentes do rápido degelo das geleiras e a saúde declinante dos recifes de coral, sensíveis ao calor, indicam que a mudança climática está se acelerando. O mesmo padrão pode ser notado no compromisso maior com a proteção de áreas silvestres e diversidade biológica: novas leis estão sendo promulgadas, consumidores estão exigindo produtos de madeira benéficos à ecologia e resorts ecoturísticos estão surgindo quase tão rapidamente quanto as empresas ponto-com.  Todavia, silvicultores e biólogos informam que estas ocorrências encorajadoras não reverteram a perda maciça de florestas ou a maior crise de extinções que o mundo já testemunhou em 65 milhões de anos.[v]

 

Considerados há muito como questões distintas, consignados a órgãos governamentais independentes, os problemas ecológicos e sociais são, na realidade, interligados e se reforçam mutuamente. O ônus da sujeira no ar e na água e dos recursos naturais dizimados invariavelmente recai nos menos favorecidos. E os pobres, por sua vez, são freqüentemente compelidos a derrubar a árvore mais próxima ou a poluir o córrego local, a fim de sobreviver. A solução de um problema sem cuidar do outro é simplesmente inviável. A pobreza e o declínio ambiental estão profundamente incorporados aos sistemas econômicos modernos. Nenhum é um problema periférico que pode ser considerado isoladamente. O que é preciso é o que Eduardo Athayde, Diretor Geral da UMA - Universidade Livre da Mata Atlântica, na Bahia, denomina “econologia,” uma síntese de ecologia, sociologia e economia, que pode ser utilizada como base para a criação de uma economia social e ecologicamente sustentável – o principal desafio que a humanidade enfrentará ao se iniciar um novo milênio.[vi]

 

O desafio é ainda maior pelo fato de ter de ser enfrentado simultaneamente em nível nacional e global, requerendo não apenas cooperação mas parceria entre o Norte e o Sul.  A responsabilidade pela saúde atual do planeta e de seus habitantes humanos é dividida desigualmente entre países ricos e pobres, mas para resolver estes problemas os dois grupos de nações precisarão fazer valer suas respectivas forças e capacidades. Isto exigirá uma nova forma de globalização – que vá além dos elos comerciais e fluxos de capital até ligações políticas e sociais fortalecidas entre governos e grupos de cidadãos.

 

Um grupo seleto de grandes países industrializados e em desenvolvimento – um grupo que pode ser chamado de E-9, considerando que são atores-chave tanto ambientais quanto econômicos – poderá desempenhar um papel central para eliminar o distanciamento Norte-Sul. Em conjunto, este grupo de países representa 57 porcento da população mundial e 80 porcento da produção econômica total (Ver Tabela 1-1). Este capítulo utiliza os dados destes nove países e regiões para esclarecer tendências econômicas, sociais e ecológicas, porém este agrupamento não tem apenas um valor analítico. Como discutido no final do capítulo, a cooperação do grupo E-9 poderá ser a chave para se atingir um progresso econômico e ambiental acelerado no novo século.[vii]  

 

Tabela 1-1.  Perfil Populacional e Econômico do Grupo E-9

País ou

Grupo

População,

2000

Produto Interno Bruto,

1998

 

(milhões)

(bilhões de dólares)

China

1.265

924

Índia

1.002

427

União Européia1

375

8.312

Estados Unidos

276

7.903

Indonésia

212

131

Brasil

170

768

Rússia

145

332

Japão

127

4.089

África do Sul

  43

137

         1Dados não incluem Luxemburgo.

FONTES:  Banco Mundial, World Development Indicators 2000 (Washington, DC: 2000), 10–12; Population Reference Bureau, “2000 World Population Data Sheet,” wall chart (Washington, DC: junho de 2000).

 

 

UM CONTO DE DOIS MUNDOS

 

Em meados do ano 2000, duas notícias das Filipinas chegaram às manchetes de todo o mundo. Em junho, um vírus de computador, apelidado de lovebug [vírus do amor], apareceu quase que simultaneamente em todos os continentes, destruindo os sistemas de dezenas de corporações multinacionais e órgãos governamentais, desde o Pentágono até o Parlamento Britânico. Custo total estimado da destruição: US$ 10 bilhões. Especialistas em segurança de computadores e agentes do FBI rapidamente rastrearam o vírus diabólico até uma pequena escola técnica de Manila e um estudante de 24 anos chamado Onel de Guzman. Para os especialistas, isto pode ter sido uma indicação da vulnerabilidade da Internet global, mas nas Filipinas tornou-se rapidamente um motivo de orgulho nacional. As pessoas consideravam o debacle do vírus um sinal encorajador que sua nação em desenvolvimento estava dando um salto para os escalões superiores do setor mais “quente” da economia global.[viii]

 

 

Sucessos econômicos e fracassos sociais

são vistos hoje lado a lado em todo o

mundo, nesta época de suposta abundância

 

 

Do outro lado da cidade, um bairro de Manila chamado Terra Prometida foi alvo de notícias bem mais sérias um mês depois: mais de 200 pessoas foram mortas num imenso deslizamento de terra seguido de incêndio. Embora esta tragédia tenha sido provocada pelo Tufão Kai-Tak, foi tudo menos um desastre natural. A Terra Prometida, como se viu, é um misto de lixão/favela abrigando 50.000 pessoas, a maioria das quais ganha a vida como badameiros dos alimentos e materiais descartados pela crescente classe média de Manila. Após dois dias de chuvas intensas, a montanha de lixo despencou em cima de centenas de casas e dos cabos de energia, causando um incêndio de grandes proporções. Dezenas de pessoas foram soterradas, outras queimadas vivas e outras tantas envenenadas por produtos químicos tóxicos liberados pelo fogo.[ix]

 

Sucessos econômicos e fracassos sociais são vistos hoje lado a lado, não apenas nas Filipinas mas em todo o mundo, nesta época de suposta abundância. A produção anual da economia mundial cresceu de US$ 31 trilhões em 1990, para US$ 42 trilhões em 2000; comparativamente, a produção total da economia mundial em 1950 foi de apenas US$ 6,3 trilhões. E em 2000, o crescimento da economia mundial disparou para uma taxa anual de 4,7 porcento, a maior da última década. Este aumento da atividade econômica permitiu a bilhões de pessoas adquirirem novos refrigeradores, televisores e computadores, criando milhões de empregos. Ligações telefônicas globais cresceram de 520 milhões em 1990 para 844 milhões em 1998 (um aumento de 62 porcento), e os assinantes de celulares aumentaram de 11 para 319 milhões neste período (um aumento de 2.800 porcento). Enquanto isto, o número de computadores “anfitriões,” uma medida da expansão da Internet, cresceu de 376.000 em 1990 para 72.398.000 em 1999 – um aumento de 19.100 porcento.[x]

 

A prosperidade econômica da última década não ficou restrita aos países ricos do Norte. A maior parte do crescimento está ocorrendo nas nações em desenvolvimento da Ásia e da América Latina, onde reformas econômicas, redução de barreiras comerciais e um incremento de capital estrangeiro alimentaram investimentos e consumo. Entre 1990 e 1998, a economia brasileira cresceu 30 porcento, a da Índia expandiu em 60 porcento e a da China disparou em notáveis 130 porcento. A China, hoje, possui a terceira economia mundial (segunda, se for medida em termos de paridade de poder de compra) e uma próspera classe média que trabalha em escritórios, se alimenta de fast food, assiste TV a cores e surfa na Internet. A China, sozinha, tem hoje 420 milhões de rádios, 344 milhões de televisores, 24 milhões de telefones celulares e 15 milhões de computadores.[xi]

 

Mesmo assim, a economia global continua maculada por grandes disparidades. (Ver Tabela 1-2.) O Produto Interno Bruto (PIB) per capita varia de US$ 32.350 no Japão para US$ 4.630 no Brasil, US$ 2.260 na Rússia e apenas US$ 440 na Índia. Mesmo quando medido em termos de poder de compra, o PIB por pessoa nestes países varia por um fator de 10. A renda per capita aumentou 3 porcento ao ano em 40 países, desde 1990, porém mais de 80 nações têm rendas per capita inferiores à de uma década atrás. Dentro dos países, as disparidades são ainda mais surpreendentes. Nos Estados Unidos, os 10 porcento mais ricos da população têm seis vezes a renda dos 20 porcento mais pobres; no Brasil a relação é de 19 para 1. Cerca de 12 porcento das pessoas que vivem em países “ricos” ainda estão abaixo da linha da pobreza e, em muitos, a desigualdade aumentou durante a última década.[xii]

 

 

 

 

Tabela 1–2. Tendências Econômicas nas Nações E–9

 

País

PIB per Capita, 1998

Poder de Compra per Capita, 1998

População com Renda Abaixo de US$2 por Dia,

1993–991

 
Participação na Renda ou Consumo

 

20 % mais pobre, 1993–981

10% mais rico,

1993–981

 

(dólares)

(dólares)

(percentual)

(percentual)

(percentual)

Japão

32.350

23.592

-

10,6

21,7

Estados Unidos

29.240

29.240

-

5,2

30,5

Alemanha2

26.570

22.026

-

8,2

23,7

Brasil

4.630

6.460

17,4

2,5

47,6

África do Sul

3.310

8.296

35,8

2,9

45,9

Rússia

2.260

6.180

25,1

4,4

38,7

China

750

3.051

53,7

5,9

30,4

Indonésia

640

2.407

66,1

8,0

30,3

Índia

440

2.060

86,2

8,1

33,5

   1Dados de um único ano dentro do período.      2Dados comparativos para a União Européia indisponíveis; A Alemanha é o país mais populoso da UE.

FONTE: Banco Mundial, World Development Indicators 2000 (Washington, DC: 2000), 10–12, 62–64, 66–68.

 

 

A expansão do consumo global durante a última década foi acompanhada por melhoria nos padrões de vida em muitos países e declínios em outros. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) calcula que a parcela da população mundial sofrendo o que chama de “baixo desenvolvimento humano” caiu de 20 porcento em 1975 para 10 porcento em 1997. Entretanto, dados do Banco Mundial indicam que 2,8 bilhões de pessoas, quase a metade da população mundial, sobrevivem com uma renda inferior a US$ 2 por dia, enquanto um quinto da humanidade – 1,2 bilhão de pessoas – vive com menos de US$ 1 por dia. Cerca de 291 milhões de africanos subsaarianos – 46 porcento da população da região – hoje vivem com menos de US$ 1 por dia, enquanto no sul da Ásia, este número é de 522 milhões. Este é um número assustador de pessoas que entram no novo século sem a renda necessária para suprir suas necessidades básicas, como alimento, água potável e tratamento de saúde.[xiii]     

 

Em todo o mundo, cerca de 1,1 bilhão de pessoas estão hoje subnutridas. A maioria é composta de pobres em áreas rurais, com terra insuficiente para cultivar o alimento necessário e renda insuficiente para comprá-lo de outros. Muitas destas pessoas vivem em países com excedentes alimentícios, mas enquanto agricultores abastados vendem seus produtos a consumidores da classe média em nações distantes, as receitas não beneficiam milhões de crianças famintas. Em alguns países africanos, como Quênia, Zâmbia e Zimbábue, até 40 porcento da população é subnutrida.[xiv]

 

Aproximadamente 1,3 bilhão de pessoas não têm acesso à água potável. Na China, a parcela que se enquadra nesta categoria é de 10 porcento (125 milhões de pessoas); na Índia é de 19 porcento e na África do Sul, 30 porcento. Sanitários são ainda mais raros em muitos países: 33 porcento da população do Brasil não dispõe deles; 49 porcento da Indonésia e 84 porcento da Índia.[xv]

 

A água poluída contribui em grande parte para uma das maiores disparidades que o mundo hoje enfrenta: a saúde. Embora as taxas de mortalidade infantil tenham caído de 25 a 50 porcento em muitos países na última década, ainda permanecem em 43 por mil nascimentos na China e 70 por mil na Índia. (Ver Tabela 1-3.) A maior parte da grande diferença neste número em todo o mundo resulta da subnutrição e doenças infecciosas comuns, que continuam generalizadas em muitos países pobres. Doenças mais intratáveis, como o cólera e a tuberculose, também estão se tornando epidêmicas em muitas regiões.

 

Tabela 1–3. Indicadores da Saúde nas Nações E–9

 

 

País

Dispêndios na Saúde per Capita,

1990–981

 

Mortalidade Infantil

Incidência de Tuberculose, 1997

Predomínio do HIV Entre Adultos,

1997

1980

1998

 

(dólares de poder de compra)

(por mil nascimentos)

(por 100.000)

(percentual)

Estados Unidos

4.121

8

4

7

0,76

Alemanha2

2.364

12

5

15

0,08

Japão

1.757

13

7

29

0,01

África do Sul

571

42

31

394

12,91

Brasil

503

70

33

78

0,63

Rússia

404

22

17

106

0,05

China

142

90

43

113

0,06

Índia

73

115

70

187

0,82

Indonésia

38

67

51

285

0,05

              1Dados do ano mais recente disponível.         2Dados comparativos para União Européia indisponíveis;   A Alemanha é o país mais populoso da UE.

FONTE:  Banco Mundial, World Development Indicators 2000 (Washington, DC: 2000), 90–92, 102–04, 106–08.

 

 

Mais alarmante ainda é o fato da AIDS, controlada em alguns dos países ricos, estar se alastrando rapidamente em muitas nações em desenvolvimento. A crise é particularmente aguda no sul da África que, há uma década,  tinha taxas relativamente baixas de infecção. Em 2000  as taxas de infecção do HIV já haviam atingido cifras espantosas de 20 porcento na África do Sul, 25 porcento em Zimbábue e 36 porcento em Bostwana. Décadas de crescimento na expectativa de vida estão revertendo em questão de anos, quando centenas de milhares de jovens adultos e crianças sucumbem à doença. Orçamentos de saúde estão sendo estourados e a educação solapada pelas mortes prematuras de muitos professores. Não é acidental que os países mais devastados pela AIDS sejam aqueles com altos índices de distúrbios sociais e serviços médicos limitados. Na China, os pobres que vendem seu sangue para equilibrar o orçamento doméstico, pagam um alto preço, sob a forma de infecção do HIV de agulhas contaminadas. Ironicamente em partes da África, são justamente aqueles que mal saíram da pobreza que estão sendo mais atacados – devastando uma geração de jovens trabalhadores educados, um cataclisma que poderá impedir o crescimento de uma classe média economicamente segura..[xvi] 

 

Um dos principais ingredientes do progresso econômico é a educação, e nesta frente o mundo está se saindo melhor do que há duas décadas.  (Ver Tabela 1-4.) Na Índia, a parcela de crianças em escolas secundárias elevou-se de 41 porcento para 60 porcento; na China, foi de 63 para 70 porcento; e na África do Sul, de 62 para 95 porcento.  Mesmo com este progresso, muitos países deixam de investir adequadamente em sua juventude, que provavelmente não participará ou se beneficiará dos setores econômicos mais vibrantes de hoje, e requerem não apenas a alfabetização básica mas, freqüentemente, treinamento especializado. As jovens, especialmente, recebem educação inadequada em muitos países. As taxas de  analfabetismo adulto feminino continuam em níveis altos, como 25 porcento na China e 57 porcento na Índia, níveis que praticamente garantem uma gama de problemas sociais e econômicos – e que tornam as ameaças ambientais mais difíceis de equacionar.

 

Tabela 1–4. Educação nas Nações do Grupo E-9

 

País

Taxa de Analfabetismo Adulto

   Feminino                           Masculino

Parcela de Crianças em

Escola Secundária

 

1980

1998

1980

1998

1980

1997

 

(percentual)

(percentual)

(percentual)

Alemanha1

-

-

-

-

82

95

Japão

-

-

-

-

93

100

Estados Unidos

-

-

-

-

94

96

Rússia

2

1

1

0

98

88

Brasil

27

16

23

16

46

66

África do Sul

25

16

22

15

62

95

Indonésia

40

20

21

9

42

56

China

48

25

22

9

63

70

Índia

74

57

45

33

41

60

           1Dados comparativos para a UE indisponíveis; A Alemanha é o país mais populoso da UE.

FONTE: Banco Mundial, World Development Indicators 2000 (Washington, DC: 2000), 74–76, 82–84.

 

 

TESTANDO OS LIMITES

 

Quando o navio quebra-gelo Yamal chegou ao Pólo Norte, em julho de 2000, os cientistas a bordo viram algo ao mesmo tempo comum e inesperado: uma área de mar aberto e calmo em lugar da massa de gelo, de dois a três metros de espessura, característica da região, mesmo no pico do verão. Nos 91 anos, desde que Robert Peary e Matthey Henson chegaram ao Pólo Norte em trenós puxados por cachorros, em 1909, nada igual havia sido registrado.  Mas a memória humana não é a escala adequada para mensurar esta ocorrência: os cientistas calculam que a última vez que a região polar esteve totalmente livre de gelo foi 50 milhões de anos atrás.[xvii]

 

A natureza dinâmica, mutante, da massa de gelo do Ártico indica que o mar aberto no pólo era, por ora, um fenômeno passageiro, porém registros científicos recentes confirmam a tendência subjacente. A capa de gelo da Terra está derretendo em um ritmo extraordinário. Medições por sonar realizadas por submarinos revelam um declínio de  40 porcento na espessura média no gelo polar do verão, desde a década de 50, excedendo, em muito, a taxa de degelo estimada anteriormente. Baseados nessas observações, os cientistas hoje calculam que até meados do século XXI todo o Ártico poderá estar sem gelo no verão.[xviii]

 

Entre as miríades de sinais de mudança climática causada pela atividade humana – a queima de combustíveis fósseis foi estimada recentemente como sendo a responsável pela elevação das concentrações atmosféricas de dióxido de carbono aos seus níveis mais altos em 20 milhões de anos – este degelo do Ártico pode ter sido o mais dramático. No final de 2000, o Painel Internacional sobre Mudança Climática (IPCC), o órgão científico de consultoria para os negociadores governamentais, publicou seu último relatório.  Incluiu a declaração consensual mais incisiva até hoje, que a liberação de dióxido de carbono e outros gases de estufa pela humanidade “contribuiu substancialmente para o aquecimento observado durante os últimos 50 anos.”  Até o final do século, concluiu o IPCC, as temperaturas podem estar 5 graus centígrados mais altas que em 1990 – um aumento maior do que a mudança de temperatura entre a Era Glacial e os tempos modernos.[xix]

 

Enquanto a indústria naval já começa a considerar o degelo ártico como uma oportunidade potencial de curto prazo – poderia reduzir a distância de viagem entre a Europa e o Extremo Oriente em até 5.000 quilômetros – as conseqüências ecológicas e econômicas de longo alcance seriam muito mais extensas e difíceis de prever. Os cientistas recentemente verificaram que o gelo ártico é uma peça-chave do “motor” que move a poderosa esteira rolante oceânica – a Corrente do Golfo – que proporciona ao norte da Europa o clima relativamente temperado e estável que tem permitido às sociedades européias florescerem. Sua desativação alteraria o clima da Europa mais do que em qualquer tempo desde a última Era Glacial. E como a Corrente do Golfo é um fator dominante do sistema circulatório oceânico, qualquer alteração significativa em seu curso impactaria todo o mundo. Ademais, com menos gelo para refletir os raios solares, o aquecimento global que causou o degelo aceleraria.[xx]

 

Cerca de 10.000 quilômetros ao sul do Pólo Norte encontra-se um meio ambiente muito diferente – os oceanos tropicais do mundo e seus abundantes recifes de coral, um ecossistema biologicamente rico que tem sido descrito como as florestas tropicais dos oceanos (65 porcento das espécies de peixes habitam os recifes).  Um dos mais ricos é o Recife de Barreira de Belize, na Península de Yucatan, no Caribe, local de uma expedição de mergulho recente do biólogo marinho Jonathan Kelsey e do jornalista Colin Woodard.  O que começou como uma emocionante exploração da vida marinha espetacular e multicor da região se transformou num desapontamento perturbador. “Pedras arredondadas, brilhantes e brancas pontuavam a paisagem marinha em todas as direções, um sinal de grave distúrbio do coral,” relatou Woodard. “Uma região secular de corais “chifre de alce,” do tamanho de um elefante, estava agora morta e coberta por uma camada de algas marrons, já por dois anos. Por todos os lados, os corais agonizavam.”[xxi]

 

Em todo o mundo, do Caribe ao Oceano Índico e até o Great Barrier Reef da Austrália, chegaram relatos de observações semelhantes nos últimos dois anos. Os pólipos dos corais são sensíveis à temperatura, adoecendo ou morrendo sempre que as temperaturas oceânicas sofrem qualquer elevação. O aquecimento temporário das águas que acompanha as anomalias do El Niño no Pacífico é mais danoso para os recifes de coral, porém o El Niño de 1998 foi algo diferente: informações sobre corais afetados logo chegavam de biólogos marinhos em todo o mundo, calculando que mais de um quarto dos recifes de coral estava doente ou morrendo. Em algumas áreas do Pacífico, a cifra atinge 90 porcento. Para muitas pequenas ilhas-nações, a perda de receita da pesca e do turismo, como também os maiores danos causados por ressacas resultantes da perda dos recifes de coral, podem ser suficientes para provocar o colapso de suas economias.[xxii]

 

Em seguida a outro episódio grave de branqueamento de coral uma década antes, esta epidemia recente de doenças nos corais é outra indicação forte que o mundo está aquecendo. Mas é também mais do que isto: os recifes de coral são uma versão marinha do famoso canário numa mina de carvão – vulneráveis a muitos estresses ambientais, hoje desenfreados, incluindo o esgoto urbano, o escoamento agrícola e a sedimentação que advêm do desflorestamento. A dizimação recente dos recifes de coral e a crescente freqüência destes eventos indicam que o equilíbrio ecológico do planeta foi profundamente afetado.

 

Seja o gelo ártico, corais tropicais, pesqueiros oceânicos ou florestas seculares, as forças que conduzem à destruição ecológica são variadas, complexas e, muitas vezes, perigosamente sinérgicas. A população é um fator. A expansão quase quádrupla da humanidade durante o último século aumentou drasticamente as demandas sobre os recursos naturais. A combinação de crescimento populacional com desmatamento, por exemplo, reduziu a quantidade de hectares de florestas “per capita” pela metade, desde 1960 – aumentando as pressões sobre as florestas remanescentes e incentivando a rápida expansão de florestas cultivadas. A demanda pela água, energia, alimentos e materiais foi exacerbada pela expansão sem precedentes da população mundial. E, cada vez mais, é nos países em desenvolvimento que os sistemas naturais estão declinando mais rapidamente e as pessoas enfrentando as maiores pressões ambientais. (Ver Tabela 1–5.)[xxiii]

 

Tabela 1–5. Saúde Ecológica das Nações do Grupo E–9

 

 

País

Parcela de Terra que está Florestada, 19951

Mudança no Desflorestamento Médio Anual, 1990–95

Parcela de Mamíferos Ameaçados, 1996

Parcela de Plantas em Flor Ameaçadas, 1997

Parcela de Terra sob Proteção Nacional,

1996

 

(percentual)

Rússia

22

0

11,5

-

3,1

Brasil

16

0,5

18,0

2,4

4,2

Estados Unidos

6

-0,3

8,2

4,0

13,4

China

4

0,1

19,0

1,0

6,4

Alemanha2

3

0

10,5

0,5

27,0

Indonésia

3

1

29,4

0,9

10,6

Índia

2

0

23,7

7,7

4,8

Japão

0,7

0,1

22,0

12,7

6,8

África do Sul

0,2

0,2

13,4

9,5

5,4

            1Dados podem se referir a anos anteriores.          2Dados comparativos para a UE indisponíveis;

A Alemanha é o país mais populoso da UE.

FONTE: Banco Mundial, World Development Indicators 2000 (Washington, DC: 2000), 126–28.

 

 

Entretanto,  o crescimento populacional por si só não poderia ter testado os limites ambientais tão fortemente. As pressões que impõe foram aumentadas pelos níveis crescentes de consumo, à medida que cada indivíduo exige mais do planeta. A industrialização, dietas à base de carne e sistemas de transportes centrados no automóvel estão entre as práticas altamente consumistas adotadas originalmente pelo bilhão de pessoas que vivem em países ricos, práticas estas que hoje proliferam em muitas partes do mundo em desenvolvimento. Enquanto isto, regulamentos governamentais e tecnologias de controle de emissões não acompanharam o mesmo ritmo dos países mais ricos. Conseqüentemente, a poluição atmosférica mais grave está hoje em cidades como Jacarta e São Paulo.  (Ver Tabela 1–6.)

 

Tabela 1–6. Poluição Atmosférica nas Nações do Grupo E-9

 

País

Dióxido de Enxofre

 1995

Particulados em Suspensão, 1995

Dióxido de Nitrogênio, 1995

 

(microgramas por metro cúbico)

Alemanha (Frankfurt)1

11

36

45

Japão (Tóquio)

18

49

68

A. do Sul (Cidade do Cabo)

21

-

72

EUA. (Nova York)

26

-

79

Índia (Mumbai)

33

240

39

Brasil (São Paulo)

43

86

83

China (Xangai)

53

246

73

Rússia (Moscou)

109

100

-

Indonésia (Jacarta)

-

271

-

            1Dados comparativos para a UE indisponíveis. A Alemanha é o país mais populoso de UE.

FONTE:  Bando Mundial, World Development Indicators 2000 (Washington, DC: 2000), 162–64.

 

 

A combinação do crescimento populacional com o aumento do consumo deverá provocar um salto no número de pessoas que vivem em países com déficit hídrico, de 505 milhões para mais de 2,4 bilhões, nos próximos 25 anos. Nos países que já enfrentam carência grave de água, como o Egito, Índia e Irã, a escassez da água deverá exigir importações de alimentos em larga escala. No norte da China, o lençol freático sob Beijing caiu 2,5 metros em 1999, resultando num declínio de 59 metros, desde 1965. Igualmente, a crescente demanda pelo petróleo – especialmente na América do Norte e leste da Ásia – contribuiu, no ano 2000, para a maior alta sustentada dos preços de petróleo jamais vista no mundo desde o início da década de 80. Além das razões políticas imediatas de preços mais altos para o petróleo, a causa subjacente é clara: a produção mundial de petróleo está próxima a um pico histórico, e os produtores se esforçam para atender à demanda conjunta de primeiros proprietários de carros na China e daqueles que estão comprando os grandes veículos utilitários esportivos, encontrados hoje em metade das garagens nos Estados Unidos.[xxiv]

 

Embora o crescimento da afluência na última década tenha contribuído para muitos problemas ambientais, manter o povo pobre não é a solução – moral ou prática. Nas áreas empobrecidas em todo o mundo, os pobres rurais estão sendo empurrados para terras marginais, quase sempre acidentadas, de onde precisam obter caça, colher das árvores ou desmatar a terra para pastagem ou lavouras, a fim de sobreviver. Um estudo patrocinado pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF), em 2000, sobre as causas básicas da perda da biodiversidade, concluiu que, conjuntamente com outras forças, a pobreza freqüentemente desempenha um papel principal..[xxv]

 

Nas Filipinas, por exemplo, a rica variedade de recifes de coral, florestas e manguezais – refúgios para cerca de 40.000 espécies – está encolhendo rapidamente, enquanto os bolsões remanescentes perdem muito da sua diversidade original. De acordo com o estudo do WWF, a pobreza rural e a distribuição desigual de terras, nas Filipinas, estão entre as causas principais da perda de biodiversidade que precisam ser corrigidas, para que a riqueza natural do país seja preservada para as gerações futuras. Igualmente, um estudo no estado mexicano de Campeche, no sul do país, constatou que a maior pressão sobre a Reserva da Biosfera Calakmul advém dos esforços dos povos indígenas locais para satisfazer suas necessidades materiais. O atendimento destas necessidades de forma sustentável é o componente-chave de qualquer programa eficaz de reversão do declínio ambiental.[xxvi]

 

APROVEITANDO A OPORTUNIDADE

 

O ano passado foi marcado por um debate mundial turbulento sobre os méritos da globalização econômica e como melhor assegurar o progresso acelerado, humano e ecológico, nas décadas vindouras. Praticamente, todas as reuniões importantes das instituições financeiras internacionais se defrontaram com milhares de manifestantes tentando influenciar ou interromper as discussões. Embora as demonstrações fossem marcantes, a discussão infindável sobre a liberação e globalização do mercado ser boa ou não para as pessoas e o planeta entretanto não foi um ponto particularmente construtivo para se dar início a um novo século. Cada lado tende a simplificar e vilificar a posição do outro, resultando num impasse retórico.

 

Não há dúvida alguma que a abertura de mercados em países com governos fracos, sistemas jurídicos inadequados e corrupção desenfreada, pode agravar os problemas sociais e ambientais. Entretanto, mercados mais abertos são, ao mesmo tempo, instrumentos potencialmente poderosos para a criação de oportunidades econômicas e sociais para os pobres, e incentivadores do desenvolvimento da sociedade civil. Em muitas partes do mundo em desenvolvimento, o capital está hoje mais disponível para pequenos negócios; novas idéias fluem mais livremente e a quantidade de organizações não-governamentais (ONGs) aumenta. As pessoas sentem-se mais empolgadas e energizadas com as possibilidades futuras, do que há uma década. 

 

O debate multifacetado decorrente dos protestos sobre a globalização ressoou no Banco Mundial, onde os preparativos para a edição do Relatório Sobre o Desenvolvimento Mundial – enfocando o ano de 2000 e a questão da pobreza – geraram um debate vigoroso interno e externo que levou seu principal autor, o economista da Universidade de Cornell, Ravi Kanbur, a renunciar em protesto. No centro do debate do Banco Mundial estava a posição de Kanbur e de outros técnicos e representantes de ONGs, que a liberalização dos mercados e o crescimento econômico são insuficientes, por si só, para reduzir a pobreza.[xxvii]

 

Para surpresa de muitos, a versão publicada do relatório do Banco, alguns meses depois, reconhecia o fracasso do crescimento econômico em reduzir as cifras de pobreza ou eliminar o grau de desigualdade em muitas nações.  O relatório urgia uma estratégia mais ampla e abrangente na luta contra a pobreza, observando que “facilitar o empowerment das pessoas pobres – fazendo as instituições estatais e sociais mais responsivas a elas – é importante também para a redução da pobreza.” Surge, em todo o mundo, um consenso mais consolidado: que a redução da pobreza é um empreendimento complexo que requer intervenções governamentais extensas, mas delicadas, incluindo investimentos em educação e saúde, sistemas jurídicos e financeiros firmes, reforma agrária e fortes políticas anticorrupção. A experiência da Rússia, onde a abertura do mercado foi acompanhada por um aumento de 50 porcento nas taxas de pobreza, é um alerta importante de que um sistema político sadio – no qual todos os interesses de uma sociedade são tratados adequadamente – e uma estrutura jurídica e reguladora forte são os ingredientes-chave para atender às necessidades dos pobres.[xxviii]

 

No sul da Índia, um grupo chamado

Myrada presta serviços de corretagem entre os bancos

e grupos de pessoas pobres, que utilizam o empréstimo

para abrir pequenos negócios.

 

Avanços sociais e ecológicos também exigirão um compartilhamento de compromissos para um conjunto de metas consensuais – metas que vão além do modelo de expansão de riqueza que predomina em muitos sistemas políticos modernos. A ampliação das opções humanas, a eliminação da pobreza e o equilíbrio da economia humana com os sistemas naturais da Terra, são desafios grandes o bastante para emoldurar um novo milênio, mas tão urgentes que deverão ser enfrentados dentro do século atual. Em conjunto, estas mudanças representarão uma revolução tão fundamental quanto qualquer outra na história humana – uma Revolução “Econológica” que testará nossas capacidades tecnológicas, econômicas e até mesmo nossa humanidade.

 

Transições desta magnitude não ocorrem sem pressões fortes contra mudanças, uma vez que as pessoas geralmente resistem a perturbações dos seus padrões correntes, a não ser que haja uma necessidade clara para tal. (Ver também  o Capítulo 10.)  Os antropólogos acreditam que a Revolução Agrícola ocorreu em regiões onde o estresse ambiental ou pressões populacionais inviabilizaram o estilo de vida tradicional do caçador/colhedor. Igualmente, a Revolução Industrial foi precipitada, em parte, pelos limites sociais e econômicos vigentes na economia do século XVIII. Uma Revolução Econólogica deverá ser acompanhada de um amplo reconhecimento que a mudança é necessária – que sem ela o progresso da humanidade desacelerará e reverterá. Mas é essencial , também, que as pessoas entendam as oportunidades que estarão à frente, caso a revolução seja bem-sucedida. Como declarou um representante do Greenpeace numa conferência em Oslo: “Se você quiser que um homem construa um barco, deixe-o primeiro cheirar as ilhas.”[xxix]

 

Isto não deverá ser muito difícil. O mundo, na aurora do milênio, é extraordinariamente dinâmico, e apesar da deterioração contínua refletida em muitos indicadores ecológicos e sociais, centenas de histórias de sucesso podem ser apontadas – sementes de mudança que germinarão e se espalharão, se bem nutridas.

 

Uma das mais encorajadoras histórias de sucesso dos últimos anos é a atenção crescente para o atendimento direto das necessidades dos pobres, em muitos países. Investimentos governamentais em educação e saúde aumentaram substancialmente em algumas nações, incentivados em parte por compromissos maiores das instituições financeiras internacionais. A América Latina, particularmente, que tem sido marcada historicamente por enormes desigualdades, vem reduzindo a distância, investindo intensamente nas pessoas. Desde 1980, por exemplo, a parcela de crianças brasileiras no ensino secundário subiu de 46 para 66 porcento, enquanto a proporção de mulheres analfabetas caiu de 27 para 16 porcento. E no pobre estado nordestino do Ceará, um programa preventivo de saúde, com 7.300 agentes comunitários de saúde, 235 enfermeiras formadas e uma campanha na mídia, contribuiu para um declínio na taxa de mortalidade infantil, de 102 por mil nascimentos para 65.[xxx]

 

 A solução das grandes questões de gênero que ainda existem em muitos países é uma das chaves para o progresso social. Em muitas partes da Ásia, África, Oriente Médio e América Latina, as mulheres ainda não possuem os direitos legais usufruídos pelos homens, sendo-lhes negados acessos iguais à educação, crédito e outros ingredientes do progresso econômico. Isto não apenas coloca em desvantagem metade da população humana, como também impede o avanço de pequenos negócios e lavouras que são dominados por mulheres em muitos países. Mas esta situação começa a mudar também, à medida que as mulheres organizam ONGs como a Self-Employed Women’s Association [Associação de Mulheres Autônomas], na Índia, que tem prestado apoio cotidiano às mulheres, dando-lhes também uma voz no sistema político estabelecido. Em todo o mundo, muitas das barreiras sociais ao progresso das mulheres estão sendo lentamente eliminadas.[xxxi]

 

Uma das recentes inovações sociais que tem se mostrado particularmente útil às mulheres é o microcrédito, um conceito lançado pelo Grameen Bank, de Bangladesh e o BancoSol, da Bolívia. Durante a última década, esta abordagem foi adaptada a dezenas de países, beneficiando mais de 10 milhões de mutuários com minúsculos empréstimos que os tornam pequenos empresários, capazes de ter e gerir seus próprios negócios. No sul da Índia, um grupo chamado Myrada presta serviços de corretagem entre os bancos e grupos de pessoas pobres, que utilizam o empréstimo para abrir pequenos negócios. Estes esforços ajudaram a ensinar a muitos legisladores que a falta de acesso a um capital exeqüível limita o progresso econômico em muitas comunidades pobres. As instituições financeiras internacionais e os países industrializadas estão, hoje, fornecendo recursos para apoiar muitos programas de micro-crédito.[xxxii]

 

O progresso social também requer um meio ambiente sadio, particularmente em áreas rurais onde os pobres geralmente dependem de recursos locais para alimento, água, abrigo e energia – um fator que fica de fora das equações desenvolvimentistas utilizadas pela maioria dos economistas. Em muitos casos, desmatamento, erosão do solo e exaustão da água subterrânea têm deixado aldeões sem condições de satisfazer suas necessidades básicas e sem os recursos financeiros necessários para investir em progresso social. A experiência na Índia, entretanto, tem demonstrado que capacitar as comunidades e proporcionar assistência no manejo de suas florestas e bacias hidrográficas locais pode levar a rápidas melhorias no padrão de vida.[xxxiii]

 

Outra inovação enraizada nos últimos anos foi a agricultura orgânica. Mais de 7 milhões de hectares de terras agrícolas estão hoje destinadas ao cultivo orgânico, quase dez vezes mais do que na última década. Sérios problemas recentes com os alimentos, particularmente na Europa, incentivaram a demanda dos consumidores por alimentos livres de agrotóxicos e fertilizantes, como também o reconhecimento crescente dos benefícios ecológicos destes novos métodos de cultivo. Agências governamentais contribuíram para este crescimento, através da certificação de alimentos orgânicos e, em alguns casos, de subsídios. Agricultores privados obtiveram vantagens dos altos preços das culturas orgânicas, plantando mais áreas através de novas técnicas. (Ver Figura 1-1.) E com barreiras comerciais sendo extintas, os agricultores em países como a Argentina, Índia e Uganda estão cultivando alimentos orgânicos para exportação a países industrializados.  A um custo aproximado de US$ 22 bilhões anuais, o mercado global de alimentos orgânicos ainda é uma minúscula fração do total, porém taxas de crescimento recentes indicam que uma massa crítica está sendo alcançada e que poderá, em breve, possibilitar a maioria dos alimentos ser cultivada desta forma.[xxxiv]

 

 

Figura 1-1. Área Orgânica Certificada na União Européia, 1985-99


 

 

 

 


Equiparando-se à prosperidade da agricultura orgânica está o incremento recente do interesse em produtos de madeira com certificação ambiental. O que começou como um pequeno movimento de consumidores indignados com produtos de madeira, advindos de florestas nativas, alastrou-se recentemente atraindo grandes compradores, como a Home Depot e duas das maiores empresas de construção de residências dos Estados Unidos.  A chave desta mudança no mercado de produtos de madeira é o Conselho de Manejo Florestal que estabeleceu o primeiro sistema de certificação, no início da década de 90. Em conjunto com o Fundo Mundial para a Natureza no Reino Unido, estabeleceu os primeiros grupos de compradores; hoje, mais de 600 empresas diferentes em 18 países pertencem ao Global Forest and Trade Network, e cerca de 25 países estão desenvolvendo normas florestais sustentáveis. Atualmente, 20 milhões de hectares de floresta estão sob manejo sustentável de certificação independente, um número que está projetado a crescer para 200 milhões de hectares até 2005.[xxxv]

 

O “esverdeamento” do mercado de produtos de madeira está sendo seguido pelo surgimento recente de um mercado para energia “verde.” A eletricidade, gerada principalmente do carvão e da energia nuclear na maioria dos países foi, no passado, vendida como uma commodity única, não diferenciada. Todavia, alguns governos, hoje, estão exigindo a “rotulagem” da eletricidade nas contas de energia e permitindo tanto as empresas públicas quanto os produtores independentes de energia comercializar a eletricidade de fontes diferentes – sendo em geral as mais populares a energia renovável da biomassa, eólica e solar. Entre os países onde números consideráveis de consumidores de energia se alistaram na energia verde estão os Estados Unidos (particularmente a Califórnia, Colorado e Pensilvânia), Austrália, Alemanha, Japão e Holanda. A energia verde está se tornando popular com empresas e consumidores particulares, que estão sinalizando fortemente ao mercado as fontes energéticas que preferem. Isto provavelmente levará a investimentos adicionais substanciais em energia renovável nos anos vindouros.[xxxvi]

 


Uma manifestação do interesse crescente na energia verde é o próspero mercado de energia eólica nos últimos dois anos (ver Figura 1-2); em 1999, as vendas de turbinas eólicas cresceram 65 porcento – quase tão rápido quanto as vendas de telefones celulares. Embora os mais de 18.000 megawatts de energia eólica projetados para estar implantados até o final de 2000 produzam menos de 1 porcento da eletricidade mundial, esta parcela já ultrapassou 2 porcento na Alemanha e representa mais de 10 porcento na Dinamarca.[xxxvii]

 


Figura 1-2. Capacidade Mundial de Geração de Energia Eólica, 1980-99

 

 

 

A concentração, em apenas poucos países, do desenvolvimento da energia eólica é o reflexo

de políticas que proporcionam acesso ao mercado em condições favoráveis, motivadas pelos empregos locais e receitas fiscais gerados pelos investimentos na energia eólica. Entretanto, tendo em vista a tecnologia da energia eólica ser baseada em componentes e técnicas fabris padronizadas, tem se disseminado rapidamente de uma nação à outra, à medida que as políticas de eletricidade são alteradas. Em 2000, grandes projetos de energia eólica tiveram início na China, Japão, Índia e Estados Unidos, indicando que alguns dos maiores mercados energéticos do mundo estão se inclinando mais para o desenvolvimento eólico. Outro sinal dos tempos é o anúncio da gigante de equipamentos de energia, ABB, que está deslocando seu foco histórico das usinas térmicas multibilionárias para geradores menores em pequena escala, inclusive energia eólica e outras tecnologias de energia renovável.[xxxviii]

 

Do microcrédito à microenergia, a lição dos últimos anos parece ser que mudanças rápidas são possíveis – quando as condições são propícias. Mesmo quando o degelo súbito do Pólo Norte nos lembra que os problemas ambientais não seguem uma progressão clara e linear, podemos tirar algum conforto em saber que as soluções ambientais e sociais também podem se desenvolver em taxas exponenciais. Este processo de mudança – e como acelerá-lo – é analisado em detalhes no Capítulo 10.

 

O NORTE ENCONTRA O SUL

 

Cientistas, estudando a evolução inicial das tecnologias, observaram que alguns dos dispositivos e práticas de maior sucesso surgiram quando uma sociedade humana assumiu uma idéia desenvolvida em outro lugar, adaptando-a e aperfeiçoando-a. De fato, mesmo antes da era das explorações ter aberto a maior parte do mundo à rápida difusão de idéias, a lenta disseminação de inovações, de um vilarejo para outro, permitiu que culturas tão distantes como as da Europa Ocidental e da China aprendessem uma da outra. Mas tal difusão sempre ocorreu mais rapidamente numa direção Leste-Oeste do que Norte-Sul, onde variações climáticas e desertos de difícil penetração tornavam as viagens e as comunicações mais problemáticas.

 

No mundo moderno, estas barreiras tradicionais praticamente desapareceram. Pode-se viajar fisicamente para quase todos os cantos do planeta num período de um dia e a Internet proporciona ligações quase instantâneas entre culturas diversas, em lugares distantes. A questão hoje é se este potencial de comunicações e o nível crescente de comércio entre as nações, pode ser transformado num esforço comum para equacionar problemas comuns.

 

Os maiores benefícios viriam de um compromisso compartilhado Norte-Sul para um mundo sustentável, uma vez que as diferenças de perspectiva entre países ricos e pobres têm prejudicado os esforços de lidar efetivamente com questões que vão desde crescimento populacional e diversidade biológica até a mudança climática. Em muitas negociações internacionais, acusações têm entravado as ações e atrasado a adoção de políticas eficazes. É hora dos países industrializados assumirem sua responsabilidade histórica pelo estado atual do planeta – e hora dos países em desenvolvimento reconhecerem que correm um grande risco com os problemas ambientais, mas que também se beneficiarão das oportunidades econômicas que se apresentam num novo caminho de desenvolvimento. Ônus e liderança divididos são hoje de crucial importância.

 

Tomemos um exemplo: A mudança climática é um problema desigualmente distribuído. Os países industrializados produziram a maior parte dos gases de aquecimento que causam a mudança do clima, porém são os países em desenvolvimento que sofrerão os efeitos mais graves. As nações densamente habitadas do sul e leste da Ásia e da África Ocidental, onde milhões de pessoas vivem em deltas imensos ao nível do mar, ou abaixo, são mais vulneráveis à elevação do nível do mar. Em Bangladesh, por exemplo, uma elevação de 1 metro inundaria 3 milhões de hectares e desalojaria 15-20 milhões de pessoas. No Delta do Mekong, no Vietnã, estes números são 2 milhões de hectares e 10 milhões de pessoas. Na Nigéria, cerca de 70 porcento do litoral seria coberto e quase 4 milhões de pessoas seriam desalojadas, inclusive muitos residentes de Lagos, a capital. Outra descontinuidade Norte-Sul reside no fato das tecnologias para o combate à mudança climática, como produtos químicos industriais mais benignos, células de combustível e solar fotovoltáicas advirem principalmente dos centros de pesquisa e desenvolvimento dos países do Norte, quando os prósperos mercados industriais e energéticos, onde são mais necessários, estão no Sul.[xxxix]

 

Preencher estas lacunas entre o Norte e Sul exigirá uma combinação de reformas inovadoras de mercados e um compromisso comum dos governos para ocupar os espaços deixados pelo setor privado. A maior parte da ênfase recente tem estado no mercado, apontando para desenvolvimentos como o mercado de  produtos florestais certificados e o interesse crescente dos consumidores no ecoturismo. E mesmo os tratados negociados por governos, como o Protocolo de Kyoto sobre mudança climática, dependem hoje de mecanismos de mercado como instrumentos principais para a consecução dos objetivos. Programas de negociação de gases de estufa estão sendo considerados como uma forma não apenas de reduzir as emissões da forma mais eficiente possível, mas também de distribuir o ônus do equacionamento do problema entre vários países.

 

Mecanismos de mercado são, freqüentemente, eficazes e as inovações privadas são a chave para a solução de muitos problemas, porém a cooperação Norte-Sul terá que se basear em algo mais do que relações comerciais para que os problemas mundiais atuais sejam superados. A cooperação entre ONGs, por exemplo, permite que programas sociais e técnicas políticas inovadoras sejam rapidamente transferidos de um país para outro, acelerando dramaticamente o ritmo do progresso. O recente incremento no número destes grupos, no mundo em desenvolvimento, está sendo incentivado pelo apoio de fundações, nos países industrializados, como também pela disseminação da democracia em muitas nações pobres. E a Internet está provando ser de grande utilidade para a disseminação da sociedade civil em países onde tem sido fraca no passado. A capacidade dos cidadãos se comunicarem facilmente entre si – e com pessoas em terras distantes com interesses afins – está transformando rapidamente a equação política em muitos países e criando condições mais favoráveis para a solução dos problemas sociais e ecológicos.

 

A liderança governamental também é importante: os governos precisam formar parcerias fortes e suprir recursos suficientes para investimento em infra-estrutura pública necessária para apoiar uma economia sustentável. O fracasso de muitos países industrializados em cumprir os compromissos financeiros que assumiram nos termos de vários acordos internacionais, e o fracasso de alguns países em desenvolvimento em executar reformas políticas e econômicas, deixaram um resquício de desconfiança que deve ser superado. Embora seja improvável que os níveis de ajuda externa jamais retornem aos valores típicos das décadas de 60 e 70, um fluxo constante de subvenções bem direcionadas é essencial para sustentar o progresso. E com o capital privado assumindo a maior parte do ônus do crescimento industrial e infra-estrutura em larga escala, a ajuda governamental poderá ser dirigida para as necessidades prementes, com efeitos multiplicadores no progresso humano e proteção ambiental: áreas como educação, tratamento de saúde, situação das mulheres, microcrédito e amplo acesso à Internet. .  Um passo essencial é a redução dos encargos das dívidas dos países em desenvolvimento que já atingiram níveis onerosos nos últimos anos. (Ver Capítulo 8.)

 

A fraqueza econômica e política de muitos países em desenvolvimento tem impedido que assumam uma posição mais central no cenário mundial, que hoje pertence logicamente a eles. Com 80 porcento da população mundial, o grosso dos recursos naturais e uma oportunidade de aprender dos erros históricos dos países industrializados de hoje, parece claro que o Sul, cada vez mais, dominará o século XXI. O verão setentrional de 2000 anteviu um sinal intrigante do futuro, quando o México elegeu seu primeiro presidente de fora do partido tradicional dominante. Vicente Fox, um líder moderno, bem educado e carismático, foi a Washington e advogou a livre movimentação de trabalhadores através da fronteira EUA-México, como o capital hoje o faz.[xl]

 

A estrutura existente de instituições internacionais, como o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio, terá que ser reformada, permitindo que os países em desenvolvimento assumam o papel mais central que é hoje essencial para a solução dos mais difíceis problemas mundiais. Com o poder compartilhado virá a responsabilidade compartilhada – algo mais exeqüível hoje do que há duas décadas, quando sistemas políticos participativos ainda eram raro no mundo em desenvolvimento.

 

Um novo princípio organizacional particularmente adequado para os países é o grupo E-9, descrito anteriormente – uma coalizão de países do Norte e Sul que, somados, têm muito mais impacto sobre as tendências sociais e ecológicas globais do que o Grupo dos 8 (G-8) – países industrializadas que se reúnem anualmente para discutir política econômica internacional. Em conjunto, o E-9 tem 60 porcento da população mundial, 73 porcento das emissões de carbono e 66 porcento das espécies vegetais mais importantes (ver Tabela 1-7). Eles têm tanto a capacidade quanto a responsabilidade para liderar o mundo no enfrentamento dos principais desafios do século XXI.[xli]

 

A cooperação Norte-Sul terá que se basear em algo mais do que relações comerciais, para que os problemas mundiais sejam superados.

 

Tabela 1–7. O E-9: Líderes para o Século XXI

 

 

 

País

Parcela da População Mundial, 1999

Parcela do PIB em Poder de Compra por Pessoa, 1998

Parcela das Emissões Mundiais de Carbono, 1999

Parcela da Área Florestal Mundial,

1995

Parcela das Espécies Mundiais de Plantas Vasculares, 1997

 

(percentual)

China

21,0

10,2

13,5

4

11,9

Índia

16,5

5,4

4,5

2

5,9

União Européia

6,3

20,5

14,5

3]

-

Estados Unidos

4,6

21,3

25,5

6

6

Indonésia

3,5

1,3

.9

3

10,9

Brasil

2,8

2,9

1,5

16

20,8

Rússia

2,4

2,4

4,6

22

-

Japão

2,1

8,0

6,0

0,7

2,1

África do Sul

0,7

0,9

2,0

0,2

8,7

Total do E-9

59,9

72,9

73

56,9

66,3

Cálculos do Worldwatch baseados em  Population Reference Bureau, “1999 World Population Data Sheet,” wall chart (Washington, DC: junho de 1999); Banco Mundial, Indicadores do Desenvolvimento Mundial 2000 (Washington, DC: 2000), 10–12; BP Amoco, BP Amoco: Statistical Review of World Energy (London: junho de 2000), 38; Organização de Alimentos e Agricultura das Nações Unidas, State of the World’s Forests 1999 (Nova York: 1999); World Conservation Union–IUCN, 1997 IUCN Red List of Threatened Plants (Cambridge, U.K.: 1998), xvii, xxvii–xxxiii.

 

 

Já é hora do E-9 se organizar como um grupo semi-oficial de nações que se reuna regularmente para analisar a gama de questões econômicas, sociais e ambientais que o mundo enfrenta. Embora estas reuniões possam ser menos harmônicas e mais desregradas do que as reuniões atuais do G-8, também podem ser bem mais conseqüentes, pois envolveriam um grupo de nações com capacidade de determinar tendências globais e ajudar a forjar o consenso Norte-Sul mundial sobre questões-chave. Sob este modelo, o E-9 não substituiria organismos internacionais mais abrangentes que representam todas as nações, grandes e pequenas, mas sim incentivaria estas instituições, como também o setor privado, à ação. Um exemplo do impacto potencial é a mudança climática, onde o E-9 representa quase três quartos do mercado mundial de petróleo, carvão e gás natural, cuja combustão é a causa principal da mudança climática. Um compromisso destes nove de uma mudança rápida para eficiência energética, energia renovável e carros de emissão zero, colocaria o clima global numa nova trajetória.Igualmente, um compromisso firme pelo E-9 para lidar com as causas subjacentes da pobreza – implementando reformas econômicas e jurídicas, e proporcionando recursos – contribuiria muito para reduzir a desigualdade.41

 

No final, o desafio maior não será tecnológico ou mesmo econômico. Como escreveu o economista Herman Daly, da Universidade de Maryland, uma economia sustentável “exigiria pouco dos nossos recursos ambientais, mas muito mais dos nossos recursos morais.”  Uma destas exigências será reorganizar as instituições internacionais para que o poder se baseie não em quem tem o maior PIB, e sim num senso humano de justiça, equilíbrio – e no que é finalmente necessário para assegurar um futuro sadio para a humanidade e o planeta. Isto pode parecer um grande salto no primeiro ano do novo século. Porém, ao deixarmos um século que começou com as mulheres proibidas de votar na maioria dos países e com a guerra como o meio aceitável para resolução de diferenças entre as grandes potências, deveríamos estabelecer um alto padrão para as décadas vindouras.[xlii]

 

      ______________________

O livro Estado do Mundo 2001 e outras publicações da WWI em português, são publicados no Brasil pela UMA-Universidade Livre da Mata Atlântica / UMA Editora.

Podem ser adquiridos no site www.worldwatch.org.br , tel 55-71-3127897,

 e-mail uma@uma.org.br .

 



 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

[xii]

[xiii]

 

[xiv]

[xv]

[xvi]

[xvii]

[xviii]

[xix]

[xx]

[xxi]

[xxii]

[xxiii]

[xxiv]

[xxv]

[xxvi]

[xxvii]

[xxviii]

[xxix]

[xxx]

[xxxi]

[xxxii]

[xxxiii]

[xxxiv]

[xxxv]

[xxxvi]

[xxxvii]

[xxxviii]

[xxxix]

[xl]

[xli]

[xlii]